quarta-feira, julho 20, 2005

Pepitas doces


Olho aquele luzente de negra cor e de aspecto refinado que descansa em cima da mesinha. Olho-o e imagino todo um processo de transformação, sofrido, desde as plantações até à minha mesa, sempre feito com imenso, muito amor. Pois só assim se pode entender como algo tão abjecto ao sabor, na sua essência primária, se pode tornar num substituto para milhentas coisas e coisinhas...
Tornou-se um companheiro para tudo; chega quase a ser insubstituível! Serve para quando não tenho tempo para cozinhar (sim, eu adoro cozinhar, mas às vezes falta a paciência ou uma boa companhia...), serve para matar aquele frenesim que tenho no estômago à porta do exame, serve para quando choro e é preciso consolar a alma instantaneamente, serve para decorar o quarto, serve para quando não há mais nada para fazer, serve para um qualquer jogo de prazer entre dois seres que se querem, ali e naquele momento.
Chega a ser bem melhor que uma passa daquele charro que já rodou três vezes e ainda consome o oxigénio daquela sala. E quando juntamos aquele docinho sabor a um docinho de carne e osso, as emoções sobem aos céus e instala-se um prazer imenso, grande como os corações dos amigos.
Esses, que nunca dizem aquilo que queremos, mas sim aquilo que precisamos de ouvir. Se não, não seriam amigos na acepção mais profunda do conceito de amizade.
Os amigos são tudo e não substituíveis por qualquer prazer momentâneo, mesmo que duradouro. São eles que me vão dando as pepitas de que necessito para mais uma cruzada nestes mares de vinagre ácido, corrosivo para a minha infantilidade e ingenuidade. Os meus amigos, os meus "irmãos" de vida e de vivências, voarão sempre comigo, em mim e por mim, e eu por eles também. Porque a amizade não se explica; para mim, a amizade acontece quando assim tem que ser, ainda que tenha brotado duma necessidade circunstancial. Mas o saber fazê-la crescer e torná-la bonita, com as suas miríades de tons e de matizes, já necessita de um desinteresse absoluto e total...
No meu jardim, brotaram algumas amizades assim, puras, bonitas, simples e verdadeiras. Sei que com eles posso embelezar o meu caminho e a minha mesa. Aliás, não se trata de embelezar, mas sim de torná-las parte integrante de um percurso já longo, mas muito incipiente...
Outras há que, desabrochando sob os desígnios de um tempo incerto, parecem vibrar com as gotículas parcas e com adubos de carinhos e de pequenas coisas da vida.
Assim seja... Pois já falta pouco. Pouco para encontrar um novo canteiro e transplantar todas as rosas, margaridas, orquídeas e todos os lírios, cravos e dentes-de-leão que levarei comigo. E deixar um espacinho para novas espécies, tão lindas como as anteriores.
Até lá, viverei do chocolate... Para o corpo e para a alma não explodirem em saudade.

11 Comments:

Blogger MIN said...

Martim...gostei muito deste texto e das tuas flores perfeitas! Um beijo.

quarta-feira, julho 20, 2005 5:27:00 da tarde  
Blogger Rita said...

Que lindo, Martim, deve ser um privilégio e um prazer enorme ser-se teu amigo, fazer parte desses canteiros floridos. Muito bonita, esta homenagem implícita, estas palavras doces e voluntárias.
Beijo grande*

quarta-feira, julho 20, 2005 5:33:00 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Sorri,há coincidências assim ,fantásticas,hoje comi chocolate com vontade,saboreando,apeteceu-me,...
Adorei ler o teu texto,entendi,senti,as palavras...
um beijinho grande
ana

quarta-feira, julho 20, 2005 9:00:00 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Meu anjo lindo... Que delícia de texto... E que honra é sentir-me parte integrante da tua vida, sentir que, a cada dia, nos fundimos e unimos mais, e que, ainda que um oceano nos separe estarás SEMPRE no meu coração. Que nem o Espaço nem o Tempo conseguem separar quem se ama.
Tua. Sempre.

quinta-feira, julho 21, 2005 9:13:00 da manhã  
Blogger Walter said...

simplesmente perfeito!
walter

quinta-feira, julho 21, 2005 4:04:00 da tarde  
Blogger Chocolate said...

Muito boa sorte no teu novo jardim.
Que os teus sentidos se apurem e se refinem numa nova explosão de cheiros, cores e texturas.
Até lá, viverás de chocolate.
Espero que vivas também com Chocolate.

sexta-feira, julho 22, 2005 2:01:00 da tarde  
Blogger Kaeser said...

Não é fácil ver os verdadeiros amigos partirem...mas há "coisas" que nem o tempo e o espaço consegume derrubar!

Força AMIGO...nesta nova etapa!

domingo, julho 24, 2005 10:47:00 da manhã  
Anonymous Anónimo said...

Que jardim bonito tens em tu coração e acredito que deve ser optimo estar nele aconchegado...Deixa sim, espaço para novas flores...mesmo singelas como uma papoila.. Beijo

domingo, julho 24, 2005 11:50:00 da manhã  
Blogger Anjo Caído said...

Absolutamente genial!!!
...porque é tão bom descobrir o quão afortunados somos por termos os amigos que temos, nas horas que mais precisamos.

beijinho***

segunda-feira, julho 25, 2005 11:22:00 da manhã  
Blogger Ricardo Simaes said...

Lindo texto, Martim... Lindo mesmo...
É sempre um prazer grande ler-te. Devias escrever com mais frequência, devias. É que é mesmo bom ler as coisas que escreves.

um forte abraço,

ricardo

segunda-feira, julho 25, 2005 6:04:00 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Não tenho muitos amigos mas tenho amigos de longa data. São fundamentais quando chego a encruzilhadas. Não me dizem que rumo seguir mas estão sp prontos para me acompanhar, mesmo nas vielas fundas da minha vida. Por isso trato tb tão bem deles como das minhas plantas: adubo, água e muito carinho. Bonito texto à amizade.

terça-feira, julho 26, 2005 10:05:00 da tarde  

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